terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Sombras da luz

Carta inacabada ao Ivo 60

Assisti o espetáculo de vocês na mostra de repertório do Ivo 60 no centro cultural são Paulo. Quase um ano depois de ter visto uma das intervenções no parque da luz que a Cia fazia como parte do processo de criação de Sombras da Luz


Ver o espetáculo pronto, depois de um ano foi interessante. Interessante como o espetáculo ressoa a experiência de vocês nas intervenções. O clown transformou-se em personagens tipos que habitam transitam em praça publicas: mendigos, migrantes nordestinos, transeuntes. Como as experiências, relatos e depoimentos dessas pessoas interferiram no processo. Sem perder o jogo e o carisma que é natural ao clown. Ao mesmo tempo ver o espetáculo pronto, me fez sentir um pouco carente do que eu vi na praça da luz: Um teatro que se estabelece na interferência: quebrando com a lógica rotineira da praça das pessoas que passam rápido, pastores pregando, casais namorando, piqueniques, guardas sempre atento para manter a ordem. Judeus, pessoas fazendo caminhadas ou correndo. Criando hiatos onde algo poético e potente pode ser construído e desconstruindo. Não que essas coisas não reverberem no espetáculo, pelo contrário! O publico continua se envolvendo, e não desistindo do jogo. Porém agora, isso não é mais espontâneo e arriscado é formalizado.


sábado, 19 de fevereiro de 2011

Prometheus Nostos



Pensamento mítico é uma “verdade” que não obedece à lógica empírica nem científica, portanto é uma verdade "intuitiva" que não necessita de provas, porque está muito mais ligado “magia”, ao desejo e ao querer que as coisas aconteçam de um determinado modo. O mito tranqüiliza o homem dentro do mundo natural e estabelece modelos de atividades humanas. No ocidente o pensamento mítico começou a ser substituído por uma forma de pensar baseada na “razão” ou uma forma de pensar que se estrutura a partir da hipótese, analise , experimentação além da dialética dual que dá sentido para o mundo ( dia X noite, claro X escuro, vidaX morte...)
É difícil "racionalmente" compreender a dimensão dessa forma de pensamento.
Pensando “racionalmente” quanto mais tentamos nos aproximar do mito mais ele nos escapa.
"Prometheus Nostos"E uma encenação que busca se apropriar desse universo mitológico e se transformar no contato com o público. Aliás, essa é uma das qualidades do espetáculo protótipo: O risco. O risco mora em se mostrar ao publico um material teatral que está inacabado e que se transforma na apropriação do material mitológico e no contato com espectador. Risco de mostrar um material frágil e sem potência. A forma que a cia escolheu para este processo foi:
Primeiro: Meia hora antes de o espetáculo começar onde o publico entra no espaço da cena, que ainda não esta pronta para a apresentação, durante 10 minutos os atores contam histórias se pararam para entrar em cena. A segunda forma: durante o espetáculo espaços são delimitados por cortinas, e o público é convidado a mudar de lugar. Talvez para mostrar que uma mesma narrativa pode ser vista de várias formas.Quebrando assim com a idéia de verdade de um acontecimento, sem comprometer a narrativa principal da peça, o mito de prometeu. Nesses espaços da narrativa acontecem uma polifonia de vozes criando um rumor de estórias , uma colcha de retalhos que não tem uma origem, mas sim vem de todos os lugares.
A fragilidade da encenação acontece na impossibilidade de se compreender uma narrativa sem se posicionar, sem que essa narrativa seja uma forma de compreender ou lidar com angustias do nosso tempo. Pq essa é a dimensão da narrativa mítica que conseguimos compreender, pois as outras dimensões escapam ao modo de pensar e se relacionar com o mundo que nos ocidentais criamos ao longo dos séculos. Se olharmos pro mito só como uma narrativa fantástica, ou algo místico a gente sem perceber acaba caindo num terreno de melodramas ou em um universo de valores cristãos como acontece na encenação. Afastando-nos assim da dimensão poderosa e potente de um mito.

Prometheus Nostos


  A idéia de espetáculo em  processo de criação constante parece ser precedida pelo interesse em um material sempre vivo e em transformação. A proposta da Cia Teatro Balagan é experimentar o "espetáculo protótipo" Prometheus Nostos  nas sedes de sete diferentes grupos de São Paulo. Nos dias 18 e 19/02/2011 estiveram no Sacolão das Artes, da Brava Cia.
 O espetáculo parte de diversos textos sobre o mito de Prometeu, construindo uma dramaturgia polifônica e não linear. O espaço vai sendo modificado por quatro cortinas, ficando o público muitas vezes dividido em dois e assistindo a cenas diferentes, sem prejuízo ao entendimento da narrativa. Somos avisados antes que temos a liberdade de transitar  entre as cenas, mas só as crianças (e eram muitas) se sentiram à vontade para isso. A musicalidade da peça se mostra frágil, pretensiosa. A presença de atores-narradores é potente, mas o ritmo estabelecido se mostra monótono e as mudanças no espaço não parecem necessárias.
  É inevitável formular algumas questões que vão, todas, na mesma direção: Até que ponto esse material apresentado afeta e é afetado pelo público? Até que ponto a Cia está disponível para isso? Existe troca real? De que forma isso se reflete no processo? Até que ponto será de fato esse um processo vivo? Apesar da escolha quanto ao espaço (e também das explicações da diretora no ínicio) sugerir uma relação mais próxima com o público, a qualidade dessa relação se mostrou não muito diferente do que seria se o espetáculo fosse encenado no palco italiano.

O próximo espaço a ser visitado pelo espetáculo é o do Grupo Pombas Urbanas, no mês de março.
http://www.ciateatrobalagan.com.br/site/flash/